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CENA 2.0 - Performance e o álbum


Fonte: http://mundoestranho.abril.com.br/materia/qual-e-a-origem-da-opera

No mundo pós revolução digital em que vivemos, já é muito clichê dizer que temos uma produção musical enorme, em uma quantidade assustadoramente grande, sem precedentes na história da música ocidental. Com a popularização da internet, diversos canais surgiram e se tornaram um grande cano de escape para essas produções que não encontravam espaço nas grandes gravadoras. O MySpace, o pioneiro nesse universo, proporcionou um ambiente interativo, onde artista e público estavam mais próximos independente da sua popularidade. Essa talvez tenha sido a primeira plataforma a interagir no mercado da música de forma participativa, inserindo a música de vez na perspectiva da cultura da convergência. Logo, era questão de tempo que diferentes gerações de artistas se inserissem nesse meio.

A questão é que, literalmente, qualquer um poderia se cadastrar e deixar suas músicas disponíveis para o público. O mar musical aumentou exponencialmente, e ao mesmo tempo que a disponibilidade do conteúdo aumentou, a acessibilidade acabou ficando restrita no sentido de que uma grande quantidade de informação estava disponível, sem muitos filtros. Era e ainda é como procurar uma agulha no palheiro. Portanto, disponibilizar sua música bem produzida de forma profissional em plataformas online não é mais um diferencial, hoje é o mínimo necessário e é muito longe de ser suficiente para o “sucesso”. Que diga-se de passagem, tornou-se um objetivo tão utópico quanto relativo.

Mas se não é o suficiente, o que mais precisa acontecer? Muita coisa, impossível dizer tudo como uma listinha mágica ou uma receita de bolo. O que podemos analisar são aspectos importantes. E talvez o mais relevante seja a volta da valorização da performance. Um show bem montado, bem produzido e bem executado, passou a ser novamente o principal produto e o chamariz mais importante que alimenta todas as outras formas de comercialização da música, seja físico ou virtual e até mesmo subprodutos como camisetas, broches, etc.

Como ironia da história, antes de se poder registrar e gravar música, ela só existia ao vivo, nas performances dos músicos. Esta foi durante séculos a única maneira possível de se comercializar e difundir música. Em suma, o músico e o compositor só poderiam ser conhecidos e difundir sua obra se apresentando para uma audiência, um público. Não havia outra forma, e a performance era, obrigatoriamente, o motor. Com a possibilidade de se registrar e gravar sons e o surgimento da indústria fonográfica, a música atingiu um outro patamar na sociedade. Sua experiência passou a ser também individual e não mais essencialmente coletiva em uma apresentação pública. Após se enquadrar em um processo industrial de produção de massa, inúmeros músicos e artistas passaram a fazer parte do mercado sem realizar uma única apresentação ao vivo se quer. Sem entrar no mérito da qualidade e da fama de cada um, mas o fato é que passou a ser possível (não provável) que o compositor com uma ou poucas músicas gravadas por artistas reconhecidos ganhasse seu sustento de forma bem satisfatória, e na prática participam sim do mercado e da indústria da música como um todo. Não são poucos os exemplos. Até mesmo para grandes nomes da música, a venda de discos se tornou a obsessão e a medida do “sucesso”. O mais importante era ganhar um disco de ouro, e fazer shows era mais uma consequência do que uma necessidade ou o principal combustível. Em muitos casos os artistas faziam seus shows até a contragosto de empresários e dos diretores das gravadoras. A rigor, era muito mais importante participar dos programas de televisão e negociar as músicas com as novelas para aumentar a venda do último álbum. Em outras palavras, o disco ou álbum adquiriu um status de obra de arte, com medidas técnicas de êxito ou fracasso, ocupando um papel proeminente na indústria da música especialmente após os anos 1960.

Depois da revolução digital, MySpaces e afins, há uma grande reviravolta. Se as vendas físicas despencaram, como fica o disco de ouro? O mercado digital naturalmente cresceu nesse contexto, mas mesmo em meio a streaming e downloads, como procurar música? Como um artista pode chegar ao conhecimento do público e se inserir nessas plataformas de uma maneira satisfatória? Pelas reviravolta da história, através de uma boa performance, meu caro Watson. As outras maneiras (TVs, rádio, jornal, etc) claro que são importantes, mas inclusive uma boa performance passou a ser o principal fator que abastece também essas outras mídias. Ela é que passou a ser um filtro importante para, justamente, alavancar maiores vendas físicas, digitais, subprodutos, interatividade na rede, curtidas na página, etc. Além de ser o principal produto do artista moderno. Logo, é claro que deve ser valorizada nas estratégias da carreira. Não à toa, as grandes gravadoras já estão prevendo participações cada vez maiores nos cachês de shows dos seus artistas há alguns anos.

O álbum e a performance, na verdade, se aproximaram ao invés de se afastarem. Para vender e ter um mote interessante para a performance, é preciso ter um bom álbum também. Na perspectiva de convergência, as mídias, os métodos, não se substituem mais necessariamente. Convivem, compartilham, colaboram uns com os outros, e é isso que acontece com o álbum e a performance. Basicamente um não vive sem o outro mais, como de fato poderia acontecer durante boa parte do século XX. Ou seja, o artista passa cada vez mais a ter que viver seus dias úteis em busca de uma boa performance e um bom álbum, pra não deixar de levar sustança pro coração do cidadão comum além de sobreviver e se inserir no mercado de uma forma eficaz.

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