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CENA 2.0 - Crise ou reconfiguração?


Fonte: http://www.apertef5.com.br/crise-nao-oportunidade-de-criatividade-sim/

Por muito tempo fomos acostumados a ver um cenário trágico na música em função do surgimento de novas tecnologias, novos mecanismos de produzir e consumir música em um mundo digital. Mais precisamente, a partir dos anos 1990 até quase o final dos anos 2000, o que circulava na mídia quase como um consenso era que a indústria fonográfica (que, a rigor, era entendida como toda a cadeia que envolve música no mercado) estava em declínio e seria extinta em poucos anos devido a queda brusca de vendas de discos. E a pirataria passava, então, a ser o grande violão.

Mas esses dados refletiam, na verdade, transformações muito mais profundas do que os estudiosos e os próprias agentes da indústria talvez fossem capazes de compreender na época. E justamente por isso, a opção foi criar um alarde na tentativa de proteger com unhas e dentes o sistema montado até então, fortemente baseado na venda de discos físicos o que, como vimos em outras colunas, era o principal parâmetro pra tudo.

Não se tinha ainda a compreensão de que existia todo um cenário complexo que envolve música e seus serviços, por exemplo, além do comércio varejista e que este estava, na verdade, inserido em um contexto muito maior (veja a nossa última coluna: Indústria da música x indústria fonográfica”). Aliás ainda hoje não existe uma compreensão generalizada de enxergar a indústria fonográfica inserida em um contexto mais amplo, apenas estudos e esforços no sentido de propor essa visão que, ao meu ver, é muito mais apropriada.

Uma crise econômica existe, entre outros fatores, quando há uma queda brusca de vendas ou uma retração de mercado, por exemplo. E isso de fato ocorreu com as vendas de discos, tanto é que em 2014 as vendas digitais superaram as físicas. Mas até chegar nesse cenário, ou pelo menos até o comércio digital se mostrar como uma “salvação” para a indústria fonográfica, o protecionismo das grandes empresas do setor as levou a imprimir o discurso de crise generalizada na música do mundo. Isso além de ser uma tentativa de manter seus antigos métodos de atuação dentro dessa indústria, poupava análises mais complexas de revisão de seus próprios mecanismos e também de compreensão do todo que de fato as cercava. Pelo menos aos olhos da opinião pública.

Se de fato a indústria fonográfica atravessou uma grande crise por mais de uma década, não podemos dizer o mesmo da indústria da música em meio a expansão da internet, surgimento de uma série de plataformas de consumo de música, ampliação das comunicações e divulgação, interação com o público, individualização ainda maior da experiência musical, novos recursos de produção musical, barateamento dos equipamentos, e uma série de outros fatores que contribuíram para uma aumento das possibilidades de se fazer e consumir música em todo mundo. Sim, as vendas de discos físicos caíram mas a música encontrou rapidamente outros caminhos para ser encontrada e os jovens não tiveram dificuldades de se adaptar e acompanhar essas transformações, o que fez com que uma geração inteira crescesse com hábitos diferentes sobre o consumo de música. Logo tudo leva a crer que, diferente de outras épocas, a indústria fonográfica entrou em decadência ao mesmo tempo que a indústria da música passou por uma grande reconfiguração que resultou na sua ampliação, e não retração. Talvez somente a partir desse descolamento é que ficou mais claro que a venda de música através de um suporte físico ou digital é apenas uma parte do bolo, e não o todo. E essa reconfiguração dificilmente irá cessar completamente pois sempre está surgindo uma nova ferramenta, um novo método que abala as estruturas, em maior ou menor grau, gerando novas transformações. São novos e velhos agentes se adaptando a novos cenários, a um outro panorama do mercado e da indústria global que envolve o setor musical, que vai além do comércio de fonogramas. Se ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais, sem dúvida não consumimos e nem produzimos mais música como eles. A gente jovem reunida hoje já possui outros hábitos, pois o novo sempre vem.

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