CENA 2.0 - Reconfiguração e suas razões
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=nDLrpG0DCqI
Já é um consenso que a indústria da música sofreu grandes transformações nas últimas duas décadas. A música talvez tenha sido o setor mais afetado na sociedade após as revoluções tecnológicas e sociais que tomaram conta do mundo ocidental pós década de 1990. Tudo mudou, desde o início da produção musical até a forma de se obter o produto final. Porém ainda não está muito claro todos os fatores envolvidos nessas mudanças, e mais ainda: qual o impacto de cada um na indústria da música.
No intuito de discutir um pouco dessas razões, vamos tentar dar uma luz sobre dois desses aspectos, que são o desenvolvimento tecnológico e o surgimento e consequente fortalecimento de outras estruturas de produção.
O primeiro esteve presente no desenvolvimento da indústria durante todo o século XX. Desde o surgimento do fonógrafo até os suportes digitais, cada novo mecanismo gerava uma alteração na maneira de se produzir música. Novos microfones, a gravação elétrica, diferentes maneiras de misturar os sons, e uma série de técnicas que foram permitindo uma maior manipulação e controle do som e, em paralelo, uma melhor qualidade, mais limpa, sem ruídos e mais “agradável” aos ouvidos. Ao mesmo tempo, a cada novo suporte para se ouvir música (78RPM, LP, cassete, CD, etc) o consumidor era desafiado a mudar sua forma de ouvir. Ao contrário das tecnologias para a produção, os suportes de reprodução representaram mudanças mais pontuais, de 20 em 20 anos mais ou menos. Mas somadas, essas transformações sempre alteraram, em maior ou menor grau, aspectos sociais e mercadológicos da música. Entretanto nada se compara ao que ocorreu após o mundo digital tomar conta. Sintetizadores, amplificadores, computadores e uma série de aparatos alteraram o fazer musical, democratizando o acesso à produção resultando em um boom de compositores e produtores musicais novos em muito pouco tempo. Além disso, os suportes digitais na internet alcançaram um patamar sem precedentes de difusão e compartilhamento, o que revolucionou por completo a maneira de se obter e ouvir música. O custo da produção musical caiu drasticamente, logo a oferta de conteúdo no mercado cresceu exponencialmente. Se por um lado o acesso foi facilitado, a qualidade humana do trabalho passou a ser ainda mais valorizada. Pra se destacar em um mar de opções, a criatividade na produção passou a ser mais importante ainda.
Como consequência ou complemento desse fator, novas estruturas de produção surgiram no mercado. Inclusive para abarcar essa enorme demanda e tentar organizar minimamente a oferta desse conteúdo. As grandes gravadoras ou majors deixaram de ser, em poucos anos, a única opção para um artista participar de fato da indústria da música. O “setor independente” ou alternativo começou a se estruturar e se profissionalizar cada vez mais, oferecendo produtos tão bom ou até melhores tecnicamente do que as majors. Gravadoras e selos nacionais (indies) cresceram, ampliaram sua atuação e se organizaram no mercado durante a década de 1990, e após a virada do milênio já produziam muito mais títulos novos a cada ano do que as grandes gravadoras. Ainda mais “a margem da margem”, digamos assim, após o ano 2000 começa a se desenhar uma maneira autônoma de produção musical, na qual o próprio compositor passa a ter ao seu alcance várias ferramentas que antes não estavam disponíveis. Dessa forma, ele mesmo passa a gerenciar sua carreira e também se insere na indústria da música que, como vimos, aumentava de tamanho. Esses autoprodutores e as indies buscavam e alcançaram um profissionalismo que fez com que eles se tornassem um contraponto às produções das majors, ocupando uma série de novos e pequenos nichos que surgiam em meio às transformações.
Existem outros fatores também que se entrelaçam com esses, interferem uns nos outros e formam um cenário cada vez caótico de reconfiguração na música. Ainda vamos continuar falando sobre isso. Mas o fato é que saímos da lama ao caos, podendo tanto organizar pra desorganizar ou vice versa.